A queda nas concessões de crédito
Nos últimos meses, o uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para financiar imóveis usados sofreu uma queda drástica, afetando diretamente o mercado imobiliário. Os dados da Caixa Econômica Federal indicam uma redução impressionante de até 85% nos financiamentos de imóveis usados, principalmente no programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), voltado para a aquisição de imóveis por famílias de baixa e média renda.
Em agosto de 2024, o valor total dos financiamentos para imóveis usados no âmbito do MCMV atingiu R$ 2,8 bilhões. No entanto, em outubro desse mesmo ano, essa cifra caiu para apenas R$ 423 milhões, uma redução de 85%. O número de imóveis financiados também despencou, de 18 mil unidades para apenas 3.114, evidenciando um impacto significativo no setor.
Leia mais:
Financiamentos com FGTS despencam 80% e novas regras causam preocupação
Alterações nas regras do Minha Casa Minha Vida
O governo federal, por meio de uma reformulação das regras do Minha Casa Minha Vida, tem priorizado o financiamento de imóveis novos em detrimento dos usados. A principal alteração foi o aumento do limite de financiamento para imóveis novos, ao mesmo tempo em que foram impostas limitações mais rígidas para a compra de imóveis usados.
A partir de agora, famílias com renda de até R$ 8 mil podem financiar imóveis novos de até R$ 350 mil, e aqueles com rendas superiores podem acessar o Pró-Cotista, que permite financiamento de imóveis de até R$ 1,5 milhão. Essas mudanças geraram preocupações, principalmente entre as famílias de menor renda, que frequentemente recorriam ao FGTS para adquirir imóveis usados, uma alternativa mais acessível.
O impacto do FGTS no financiamento habitacional
Historicamente, o uso do FGTS tem sido uma ferramenta importante para facilitar a compra de imóveis, principalmente para as classes de renda mais baixa. Em 2023, mais de 29% de todo o crédito liberado pelo FGTS foi destinado ao financiamento de imóveis usados, um aumento considerável em relação aos anos anteriores.

No entanto, a preferência das construtoras por imóveis novos, que são mais rentáveis, levou o governo a adotar uma postura mais restritiva. Como resultado, a concessão de crédito para imóveis usados foi severamente limitada, com um foco crescente na construção de novas moradias, um movimento que tem gerado críticas, especialmente no que diz respeito ao acesso à habitação para as famílias mais vulneráveis.
As novas limitações para financiamento de imóveis usados
Uma das medidas mais controversas foi a redução do teto de financiamento para imóveis usados. Para a faixa 3 do MCMV, que atende famílias com renda de até R$ 8 mil, o valor máximo de imóvel financiado caiu de R$ 350 mil para R$ 270 mil. Além disso, as condições de entrada para a compra de imóveis usados foram modificadas. Nas regiões Sul e Sudeste, a exigência de pagamento inicial aumentou para 50% do valor do imóvel, enquanto em outras regiões o percentual subiu para 30%.
Essas novas condições tornam o financiamento de imóveis usados mais difícil, especialmente para as famílias que têm menos recursos para dar como entrada, o que coloca em risco o sonho da casa própria de muitas pessoas.
O foco nas moradias novas e as críticas ao programa
Com a queda nos financiamentos de imóveis usados, o governo tem intensificado a pressão sobre a construção de novos empreendimentos. O objetivo é estimular o mercado da construção civil e reduzir o déficit habitacional do país. Essa mudança favorece principalmente as grandes construtoras, que enfrentam dificuldades devido à crescente demanda por imóveis usados.
No entanto, essa estratégia não está isenta de críticas. Muitos especialistas e organizações sociais argumentam que o foco nos imóveis novos pode afastar a população de menor renda, que historicamente tem se beneficiado do financiamento de imóveis usados. Para essas famílias, as novas regras significam menos opções de moradia e um custo maior para alcançar a casa própria.
A estratégia de controle do orçamento do FGTS
A reforma das regras também inclui uma estratégia de controle mais rigoroso sobre o orçamento do FGTS. O valor destinado ao financiamento de imóveis usados foi reduzido para R$ 13,3 bilhões, uma tentativa do governo de equilibrar os interesses do mercado imobiliário com as necessidades habitacionais do país.
Essa medida gerou críticas de diversos setores, que defendem o uso mais amplo do FGTS para atender as classes de renda mais baixa. A diminuição do orçamento destinado aos imóveis usados, junto com a redução do teto para os financiamentos, reflete uma política de contenção de custos que pode afetar negativamente a acessibilidade à habitação.
Mudanças nos sistemas de financiamento
Além das modificações no programa Minha Casa Minha Vida, outras mudanças impactaram o mercado de financiamento habitacional. A partir de novembro de 2024, novas regras entraram em vigor para o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que financia imóveis de até R$ 1,5 milhão.
Essas novas regras aumentam as exigências de entrada, com a exigência de 30% do valor do imóvel no Sistema de Amortização Constante (SAC), e 50% no sistema Price, no qual as parcelas são fixas. Tais alterações impactam tanto as classes média e alta quanto as de renda mais baixa, dificultando ainda mais o acesso ao crédito para a compra da casa própria.
A situação das famílias de baixa renda
Com o aumento das exigências de entrada e a redução do limite de financiamento para imóveis usados, as famílias de baixa renda enfrentam um cenário desafiador. O Minha Casa Minha Vida continua sendo a principal fonte de financiamento para essas famílias, mas as novas condições dificultam o acesso a imóveis que anteriormente eram mais acessíveis.
O FGTS, que sempre foi uma alternativa importante para essas famílias, também perdeu parte de sua eficácia como ferramenta de acesso à casa própria, principalmente para aquelas que já estavam no limite de sua capacidade financeira. As novas regras podem forçar essas famílias a adiar o sonho da casa própria ou até a buscar alternativas menos viáveis.
Perspectivas para o futuro do crédito habitacional
Com a diminuição dos financiamentos de imóveis usados, o futuro do crédito habitacional no Brasil tende a se concentrar cada vez mais nos imóveis novos. No entanto, essa mudança pode ter impactos significativos a longo prazo, principalmente para as famílias de baixa e média renda que dependem do FGTS.
O mercado imobiliário, por sua vez, está se adaptando às novas regras, com foco no lançamento de novos empreendimentos e na criação de estratégias para manter a oferta de imóveis acessíveis. A questão do impacto sobre as classes mais baixas e sobre a classe média alta, que também depende do FGTS e do Pró-Cotista, continuará a ser um tema de debate importante no futuro do crédito habitacional no Brasil.
Conclusão
As mudanças nas regras do financiamento habitacional no Brasil, principalmente no que se refere ao uso do FGTS para a compra de imóveis usados, refletem um cenário de ajustes econômicos e tentativas de controle orçamentário. Embora essas reformas visem estimular a construção de novas moradias e reduzir o déficit habitacional, elas também geram preocupações sobre o acesso à moradia para as famílias mais vulneráveis, que enfrentam dificuldades para atender às novas exigências.
O impacto dessas mudanças será sentido principalmente pelas classes de renda mais baixa, que tradicionalmente recorriam ao FGTS para financiar imóveis usados. O futuro do crédito habitacional no Brasil dependerá de como o governo e o mercado imobiliário equilibrarão as demandas por novas moradias com as necessidades de acesso à casa própria para as populações de menor renda.